A morte de um sacana
Dizem-me que o Independente acaba hoje. Vou à respectiva página na net e confirmo.
Emoção nenhuma. Mas um post.
O Independente foi um jornal sacana, mas bom.
Tendencioso, de direita, mas legível e prazeiroso, até para gajos de esquerda como eu.
Um pouco através dele aprendi a ler e, de algum modo, a escrever. Um pouco através dele aprendi a gostar e a odiar Portugal.
No fundo (que é onde o Independente está), o saldo é positivo.
O jornal será sempre reconhecido pela sua sacanice, muitas vezes geradora de injustiças, mas também por ter sido feito, em tempos, por homens que não usavam gravata e se orgulhavam de não terem livro de cheques. Homens quase livres.
Longe vão, no entanto, esses dias em que o Independente se constituiu como o terror privativo da quinta-feira de alguns, trocando o sono de ministros e de outros quejandos por suores frios de temor à manchete do dia seguinte.
Isso – confesso – agradava-me desmedidamente.
Do jornal retirei artigos e imagens de grande qualidade, graças a pessoas como o Nuno Saraiva, o MEC, a Inês Gonçalves, o Paulo Portas, a Céu Guarda, o Júlio Pinto, o João Ferreira do Amaral, a Constança Cunha e Sá, o André Carrilho e o Paulo Nogueira.
Nunca deixei, porém, de desprezar aquele excesso estético à la CDS, da calça bege e da camisa azul com risca branca, do cabelo revirado e do gin tónico na pata superior direita, com direito, por exemplo, ao cantinho do Portugal no seu melhor, que mais não era que uma pífia demonstração de desprezo pela populaça.
Vomitei também, claro, e sempre, a linha descomedidamente liberal(ista) e atlântica.
Mas de peito feito recebi algumas doses de patriotismo (coisa eventualmente parola), reflectida na defesa que ainda faço da soberania de Portugal.
Enfim, deu para rir e aprender qualquer coisita.
É só mais uma empresa que fecha. Vítima – é curioso – de um capitalismo (também sacana) que condena ao insucesso projectos de imprensa que ousem navegar por águas diferentes das dos grandes grupos. Não deixa de ter a sua ironia.
Há anos que não leio o Independente. Mas hoje, a caminho da Festa do Avante, talvez pare o carro numa qualquer estação de serviço e, pela última vez, o compre. A luta continua!
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