domingo, 28 de fevereiro de 2010
Os neo-lusitanos
O império pode estar apático, moribundo e decadente, soterrado nos escombros das glórias do passado, mas há um grupo de lusitanos intrépidos que continua a resistir: os nossos junkies arrumadores de carros. Um arrumador tuga não se conforma com o trabalhinho das nove às cinco: custe o que custar, o tugo-junkie trabalha sempre as horas que forem precisas. Um arrumador tuga nunca tem férias: trabalha o ano inteiro, nos dias úteis e até nos dias inúteis. Há quem diga que o trabalho dos arrumadores é inútil. É mentira, há uma clara utilidade residual: de vez em quando, é mesmo difícil estacionarmos a puta do carro. Um arrumador tuga é um trabalhador brioso e digno: quando assegura que se pode estacionar em segunda fila (porque conhece melhor do que ninguém os horários do dono do carro da primeira fila) e alguém desconfia da sua palavra, fica extremamente ofendido porque a sua honra profissional foi posta em causa. Um arrumador tuga luta heroicamente contra o flagelo do envelhecimento da população, morrendo muito cedo por amor à pátria. O arrumador tuga não explora os seus clientes: está há anos a cobrar 50 cêntimos por serviço, não tendo até hoje aplicado qualquer aumento anual. O arrumador tuga não aliena a sua existência em nome de quaisquer promessas futuras: vive sempre no aqui e agora, tentando optimizar sempre o seu prazer imediato. O arrumador tuga nunca é mal encarado: não há ninguém que seja tão exageradamente bem educado como um tugo-junkie. A comunidade junkie não depende da mama do estado: auto-organiza-se espontaneamente, vivendo apenas do próprio trabalho. Cada arrumador tuga faz mais pelo combate à criminalidade do que qualquer outro português.
No outro dia, um junkie de longas barbas e olhar penetrante arrumou-me o carro no Príncipe Real e tenho quase a certeza que era Viriato. Dei-lhe uma moeda de 1 euro.
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1 comentário:
que raio se passa com o beicinho da moça?
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