terça-feira, 23 de março de 2010
O sítio do caralho mais velho
Quem só conhece um bairro social a partir dos media pensa que é um local onde tiroteios, rixas e rusgas se sucedem numa velocidade estonteante. E como normalmente nunca tem de passar por um bairro social para ir a algum sítio (já que estes bairros raramente estão integrados na malha urbana, sendo normalmente chutados para o caralho mais velho), e como evitamos sequer aproximarmo-nos destes espaços que nos metem medo (pensando que se o fizessemos imediatamente uma bala perdida se alojaria no nosso testículo esquerdo), o que é certo é que raramente temos a oportunidade de pôr à prova a pertinência do nosso estereótipo. Se finalmente sairmos das nossas zonas civilizadas e entrarmos nessas zonas selvagens, verificamos com espanto que os bairros sociais são afinal muito parecidos com aldeias. De resto quase tudo é igual: o tempo que corre lento, a centralidade da vivência de rua, a coscuvilhice entre vizinhos, a ausência de privacidade e de anonimato, o pessoal a assar bifanas num grelhador na rua, as senhoras a passearem na rua de avental e de chinelos, os estendais montados na rua, as pequenas hortas, os velhos a jogarem dominó, e sobretudo a enorme pasmaceira daquele espaço onde habitualmente nada acontece, (e onde até as transacções desviantes são feitas com uma enorme discrição, habitualmente invisível para os olhares de fora), em total contraste com o estereótipo habitual. E a diferença fundamental entre uma aldeia e um bairro social não são os dealers que existem nestes últimos mas sim a imensa tolerância que lá existe face aos mesmos: a maior parte do pessoal que vive num bairro social não se envolve em comportamentos desviantes (trabalham honestamente), mas não se importa nada de jogar dominó no café com o seu amigo de infância que é dealer ou com o seu vizinho que vende telemóveis roubados na Avenida do Brasil. Os bairros sociais são iguais à aldeia da minha avó só que com dealers em vez de tractores.
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3 comentários:
Curiosamente a tendencia agora é para sairem do caralkho mais velho, de encontro a cona da mae, que é como quem diz, plenamente integrados na urbe...Telheiras-circundado a norte pelo bairro Padre Cruz e a Este pelo bairro Horta Nova...
Depois é ir ao ex-Carrefour (snift)/Continente de Telheiras e apreciar os extremos- os betos e os xungas misturados, na mesma fila, com as senhas para o pargo legitimo e a faneca miuda a separa-los...
Tenho carinho por estes bairros sociais, que sao meus vizinhos em Lisboa, e pelo bairro da Boavista, que fica pelo meio de Monsanto...
e nunca houve droga destes bairros que nao prestasse......
Com o Bronx perto de ti, percebo perfeitamente que os nossos guettinhos despertem em ti uma doce nostalgia.
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