No século XIX, o capitalismo era selvagem e desumano. No século XXI, o capitalismo é selvagem e desumano mas com responsabilidade social. A ideia é simples. Uma grande empresa pode continuar a ter as mesmas práticas filhas da puta que sempre teve desde que implemente um marketing social bem montado que maquilhe a sua reputação. Alguns exemplos.
A empresa "Ganância, Lda." pode continuar a pagar mal aos trabalhadores (que ficam com as migalhas que sobram depois da fatia principal dos lucros ter sido generosamente distribuída pelas administrações, accionistas e quadros superiores). Não faz mal: a empresa tem um certificado de responsabilidade social, por ter ajudado a plantar arbustos de plástico num parque infantil vandalizado na Damaia de Baixo.
A multinacional "Exploitation, Inc." pode continuar a optimizar os seus lucros, obrigando os empregados a trabalhar mais horas do que a lei permite, sem direito a qualquer remuneração suplementar. Não faz mal: a empresa tem um certificado de responsabilidade social, por ter ajudado a nidificação de gambosinos no Parque do Gerês.
A empresa "Lucros Ensaguentados, S.A." pode continuar a transferir os custos que deveriam ser privados para toda a sociedade (por exemplo, poluindo o ambiente sem pagar os custos exigidos pela respectiva reparação ambiental). Não faz mal: a empresa tem um certificado de responsabilidade social por ter oferecido sobras de jornais económicos como agasalho para os sem-abrigo de Lisboa.
A empresa "O Capital é Melhor que o Sexo Oral, Lda." pode continuar a esconder os sues lucros em Offshores para fugir ao fisco, a maquilhar a sua contabilidade e a subornar as empresas de auditoria para insuflar artificialmente os seus resultados. Não faz mal. A empresa tem um certificado de responsabilidade social por ter apoiado uma investigação científica com vista à produção de pastilhas elásticas ingeríveis com sabor a urtiga.
O Estado é, claro, cúmplice deste movimento, demitindo-se progressivamente das suas funções sociais, que passam a ser transferidas para a caridade opcional e pouco consequente das empresas privadas. A este processo dá-se o nome de responsabilidade social.
sexta-feira, 14 de maio de 2010
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2 comentários:
Eu era olhado de lado num escritório antigo por não alinhar em domingos passados com os yuppies a pintar a parede do centro social da Cova da Moura. Todos os anos. O mais engraçado é que ficavam mais chocados se eu sugerisse que só o faziam por questões de marketing politicamente correcto e para se sentirem melhor o resto do ano como ricaços (2007) do que dizendo "que se foda o centro social da Cova da Moura, passadas duas semanas vai estar de novo crivado de balas" (2008).
Desde então, tenho um prazer especial em mostrar às pessoas que afinal são tão escroques como eu.
(história verídica, por mais socialmente irresponsável que pareça)
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