sexta-feira, 23 de abril de 2004

Abril

30 anos. Zé Mário Branco falava num sonho lindo, e foi isso mesmo. Mas foi mais. Após o inevitável derrube do regime, pela coragem de alguns, viveu-se a euforia e, depois, a desilusão. Abril foi também uma oportunidade perdida. Podia e devia ter chegado mais longe, mais profundo. Aqueles que comiam à mesma mesa com a ditadura, queixam-se dos excessos da Revolução, sem entender que uma Revolução não é feita de protocolos ou falinhas mansas. É, entre outras coisas, hora de vingança, e também aí Abril ficou curto. Deixou escapar muitos, por impossibilidade de os deter ou por compreensível compaixão e desejo de reconciliação. Uns fugiram para o Brasil, com o dinheiro sujo do regime que ajudaram a chupar aos portugueses, para depois voltarem a tomar conta de tudo; outros, afinal, eram democratas por natureza, e por cá ficaram, remoendo secretamente o ressentimento.
E ainda outros, como Mário Soares, regressaram cavalgando a onda da mudança, impedindo depois que a mudança fosse realmente profícua, pela sua profundidade.
A coligação do poder, utilizando um reles marketing de pacotilha, fala agora de evolução, enquanto Paulo Portas, saudoso dos tempos do império, trinca rissóis por entre os ex-combatentes, sacrificados por um regime autista e autoritário.
Quanto à apropriação, algumas palavras. Desejaria que todo o país festejasse Abril. Sinceramente. Mas não deixo que me atirem poeira para os olhos e não veja do que se trata, uma manobra de pura propaganda. Volto a repetir: alguém que apoia a deriva militarista de Bush, a privatização de tudo incluindo a água, a despesa de 770 milhões de euros em submarinos, o exército de desempregados, não me parece que se reveja particularmente nos ideais de Abril.
Que o regime actual de direita festeje à vontade.
Eu saberei onde festejar, de imenso cravo vermelho na mão. Não preciso de festas pseudo-oficiais de sorriso amarelo nos lábios.
Dia 25 de Abril, estarei na rua, junto de todos aqueles que verdadeiramente amam a Liberdade e as conquistas de Abril.
Que ninguém fique em casa. Encontramo-nos nas ruas, as nossas.

25 de Abril SEMPRE!

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