segunda-feira, 26 de julho de 2004

A Arrábida está em chamas!!!

Hoje, pela primeira vez desde há muito, chorei num local público. Não morreu ninguém que me fosse especialmente querido. Nenhum namoro de longa data e intensa paixão atingiu o seu ponto terminal. Nenhum dos factores que poderão, normalmente, precipitar alguém num pranto infantil e incontrolável tomou lugar!

A Serra da Arrábida está em chamas!!!

Enquanto bebia o obrigatório shot de cafeína matinal, num café em Azeitão, assisti, na televisão, a imagens do incêndio que devastou cerca de 700 hectares de mata, algumas propriedades e dizimou animais e plantas (alguns destes, exemplares de espécies em vias de extinção que já só existem na Arrábida).
Vi as chamas alastrarem furiosamente, sem dó nem piedade pelas encontas da serra, devastando tudo o que se cruzava no seu caminho.
Vi heróis, a quem não se atribui o devido valor, lutarem contra um elemento natural com muito mais força, poder e imprevisibilidade que eles, para defender a terra de gente que não conheciam e a serra, que é de todos nós.
Vi voluntários que inalaram fumo, correndo riscos que outros poderão considerar desnecessários, para auxiliar estes heróis de azul escuro, entregando-lhes mantimentos e leite (para a fome, a fadiga e a intoxicação).
Vi e ouvi depoimentos de quem lutou madrugada dentro para impedir que tudo o que possui fosse reduzido a cinzas.
Assisti ao drama de quem, tendo esgotado todas as suas forças a tentar, viu gorado este objectivo.

Horror, compaixão, impotência e raiva empurraram água para fora dos meus sacos lacrimais.

Horror pelo espectáculo infernal a que se assitia ontem à noite por todo Parque Natural da Arrábida.
Compaixão por todos os que lutaram e por todos os que perderam e, também, por todos os que ganharam, de alguma forma e a custo de muita coragem e suor, a sua luta para preservar algo tão precioso como a beleza e o património natural da Arrábida. Também por todos o que viram as suas coisas, ganhas com maior ou menor custo, desaparecer.
Impotência por não poder fazer nada para evitar ou remediar este dramático acontecimento (e nojo por mim mesmo ao sentir que, nem o pouco que podia fazer, fiz).
E raiva por toda a negligência que muito provavelmente originou este incêndio: negligência dos responsáveis do Parque Natural da Arrábida por não terem aumentado as medidas de prevenção durante esta época tradicionalmente complicada (depois das construções ilegais, esta falta no cumprimento de medidas de prevenção...pergunto-me o fazem estes senhores na direcção do Parque Natural? Merda é a única resposta que me surje!) e principalmente a neglicência das inúmeras familys frost que existem neste país que, para não terem de executar a tarefa hercúlea de transportar o lixo que eles próprios consomem e produzem, encontram enorme piada e facilidade em atirar todo o tipo de merda pela janela dos seus Citröens Xsara, ou Opel’s Vectra ou a puta que pariu todos esses filhas da puta, continuando felizes e airosos as suas lúdicas viagens pelo "campo", onde os habitantes são tão broncos e tão reles que não só podem, como devem, levar com o lixo produzido pelo urbanozito depressivo, que visita o arcaico espaço rural porque é chique e porque precisa de desanuviar da stressadita vidinha de escravo do trabalho. Provavelmente este "perfeito anormal" ainda tem a lata de, em contexto de conversa com outros bananas da mesma laia e, porque fica sempre bem, afirmar que é ecologista e que se preocupa imenso com as questões ambientais!

Puta que pariu todos estes filhas da puta!

Perdoem-me caros Atónitos, mas isto põe-me mesmo fora de mim!
Se ser o animal mais inteligente de todos significa destruir o nosso habitat e o habitat de outras espécies, animais ou vegetais, chacinar estes últimos e a nós mesmos, por qualquer outra razão (ou pior...sem qualquer razão) que não seja a reprodução ou a sobrevivência...penso que será realmente útil começarmo-nos a interrogar sobre o conceito de inteligência e sobre a utilidade da mesma; porque se passar apenas pelo egocentrismo do conhecimento...será talvez bom que caiamos no niilismo!

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