segunda-feira, 24 de janeiro de 2005

O Encarquilhado Inspector Rôla e os Desenxabidos Neo-Nazis

O tom de voz do director da Judiciária ao telefone não augurava nada de bom. Os chocos grelhados com tinta e o jarrinho de vinho verde à pressão do almoço ficaram a meio. O Fiat Uno vermelho de 87, cruza as ruas de Lisboa a alta velocidade com a desenvoltura de uma bailarina com artrose em direcção à sede dos serviços.

A elite da Judiciária estava à minha espera, o caso não era para menos. Uma série de ataques racistas perpetrados por um grupo de jovens neo-nazis, aterrorizava a população. Dois isqueiros Bic, um preto e outro azul escuro tinham sido espancados junto à estação de metro do Intendente; um pacote de mortalhas Smoking preta, porteiro de uma discoteca africana foi brutalmente esfaqueado e sofreu múltiplos ferimentos por rasgão; e mais recentemente o inqualificável assassinato da senhora Conguito e de dois dos seus trinta e oito filhos menores, em Chelas.

Há já algum tempo que os serviços tinham este grupo referenciado e sob vigilância, tendo inclusive infiltrado alguns agentes no seio do grupo. Os resultados para a Judiciária não poderiam ter sido mais nefastos, nenhum dos agentes regressou com vida da sua missão. O memorial aos que tombaram no exercício da sua função, homenageia agora mais três bravos e honrados agentes: um Duende de Jardim de Porcelana, uma Garrafa de Oitavo de Castelo e um Trapezista do Circo Chen.

Cabia agora a mim, o mais condecorado de todos os agentes da PJ, a missão de me infiltrar e tentar deter os criminosos.

A infiltração não se afigurava nada fácil, este grupo de energúmenos era muito fechado e a única solução era apelar às minhas melhores capacidades dissimulatórias. Tinha que dar o meu melhor, não havia margem para erro.

Este grupo de não era um grupo de cabeças rapadas normal, aliás distinguiam-se de todos os outros por cobrirem as suas cabeças com uma espécie de touca vermelha. De touca vermelha colocada na cabeça, dirigi-me para a sede do grupo aonde se reuniam todas as noites para jogar matecos e planear futuros ataques a vítmas inocentes.

Pela calada da noite e econberto pela ausência de luar, aproximei-me com as maiores cautelas da sede do grupo que se situava num terreno baldio ali para os lados de Loures. A sede era uma pequena caixa de fósforos e estava bem identificada pelo símbolo do grupo: as cinco quinas.

Entrar na pequena sede revelou-se não só um exercício de camuflagem como também de contorcionismo. Tive que partir ambos os joelhos e de deslocar o ombro esquerdo. Entrei.

O local estava apinhado até ao tecto de cabeças vermelhas, entretidos a beber minis e a preparar novos actos criminosos.

Hora e meia depois já tinha reunido todas as provas de que necessitava contra o grupo, estava na altura de mandar avançar os reforços e efectuar as detenções. Antes disso um cigarrinho. Cigarro na boca, puxo do Zippo para o acender. Num repente todas aquelas cabeças vermelhas nazis começam a inflamar-se violentamente, uma atrás da outra. O pânico é geral e a confusão total, consigo escapar por um triz.

Dos nazis, nem um sobrevivente.

Cá fora, os paramédicos tratam-me de algumas queimaduras ligeiras. Saco de outro cigarro e do fiel Zippo. A noite está fria. Tenho fome.

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