Caim mata Abel, Abel mata Caim
Existe uma maioria de esquerda no Parlamento: PS, BE e CDU coligados transcenderiam em muito o patamar da maioria absoluta, podendo assegurar um governo estável de coligação. No entanto, o sectarismo empedernido da esquerda (em que nenhum dos três partidos está inocente) torna este cenário impossível. O PCP e o PS não se entendem por razões históricas: o PREC foi sobretudo uma luta de poder entre Cunhal e Soares, tendo ganho este último, o que o PCP nunca perdoou. O BE não se entende com o PS principalmente porque o BE tem uma cultura irresponsável de anti-poder (não quer sujar as mãos no lodo sujo do poder) e porque quer demagogicamente capitalizar o descontentamento com o governo. Apesar de, pela parte do PS, haver provavelmente uma atitude um pouco mais favorável a entendimentos com o BE, é também certo que a progressiva viragem ideológica do PS à direita não facilita em nada essa convergência. O PCP e o BE não se entendem por causa de uma cultura sectária de ambos (apesar de, cada vez mais, o BE ser mais favorável a uma convergência de ambos, enquanto o PCP se mantém irredutivelmente só). E quem é que ganha com a divisão descerebrada da esquerda? A direita, evidentemente. E quem é que perde com esta guerra fratricida entre irmãos desavindos: os desempregados, os pobres, o estado social. Caim mata Abel, Abel mata Caim.
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6 comentários:
O primeiro passo terá que vir do PS. É ele quem, legitimamente, tem que formar governo.
Se o PS quisesse realmente governar à esquerda, acredito que tanto o BE como o PCP fizessem um genuíno esforço de aproximação.
Não havendo, até ver, qualquer sinal de que tal venha a suceder, a união das esquerdas não passará de um mero exercício académico.
Dúvida: ao admitir uma aliança com o BE e com o PCP, não estará o PS a trair uma parte importante do seu eleitorado?
A generalidade das pessoas que votaram no PS apreciou favoravelmente o desempenho governativo. Assim sendo, como poderemos encontrar qualquer conexão entre estes votos (socialistas) e os votos de bloquistas e comunistas?
Em parte, tens razão. Um voto no PS parece validar as políticas de direita do PS: código laboral que aumenta o desnível de poder entre o trabalhador e a entidade patronal; privatização da Galp (transformando um monopólio público num monopólio privado, sem quaisquer vantagens para o consumidor); enfraquecimento dos serviços públicos da saúde e educação (taxas moderadoras para internamentos e urgências; aumento de propinas; ausência de comparticipação no pagamento das propinas de mestrado a alunos com rendimentos baixos, quando actualmente o mestrado corresponde à antiga licenciatura), e correspondente fortalecimento do sector privado concorrencial aos serviços públicos (benefícios fiscais, gestão privada hospitalar, parcerias público-privadas ruinosas); ausência de um imposto sucessório (que permita redistribuir um pouco a riqueza dos mais ricos para os mais pobres); manutenção do offshore da Madeira (institucionalizando a fuga fiscal dos mais riscos); prática e retórica anti-sindical; impostos mais baixos sobre as mais-valias bolsistas do que sobre os rendimentos resultantes do trabalho; benefícios fiscais aos bancos (e consequente perda de receita fiscal de empresas que todos os anos apresentam lucros gigantescos); falta de cobertura social a muitos desempregados (não elegíveis para subídio de desemprego, como os falsos recibos verdes), etc.. Contudo, um voto no PS parece igualmente validar as políticas de esquerda do PS: aumento substancial do salário mínimo e dos abonos para famílias de baixos rendimentos, genéricos gratuitos para os idosos com pensões inferiores ao SMN, que são quase todos), despenalização do aborto; fim do divórcio litigioso; lei da imigração das mais avançadas do mundo: quem quer que nasça em Portugal, independentemente da sua origem, poderá adquirir a nacionalidade portuguesa), etc.. Deste modo, se o PS passar a governar mais à esquerda, não estará a trair por completo o seu eleitorado, porque muitas das suas políticas foram efectivamente de esquerda. Agora, concordo completamente contigo: é o PS que terá que decidir se se quer apresentar no parlamento como Dr. Jekyll ou Mr. Hyde.
Na primeira vez que o PS conseguiu maioria absoluta, viu-se no que deu. Com poder absoluto, o partido pôde mostrar a sua verdadeira face. O PS é a verdadeira face da geração que fez Abril (e a que veio imediatamente a seguir) e que, com umas conversetas de esquerda, se aburguesou e se entreteve a comprar LCDs, monovolumes e merdas do género, enquanto se entretém a tomar conta do aparelho do Estado e das empresas públicas.
Qualquer entendimento é impossível, porque, de facto, ninguém o quer.
Meu copincha Little Bastard,
Eu compreendo que queiras levar uma vida simples e desprovida de luxos materiais, mas o teu desdém pelos LCDs e similares - já exprimido em vários posts - é-me a meu ver um impôr da tua filosofia de vida pessoal. As tuas escolhas privadas são isso mesmo e não correspondem a um verdadeiro ideário político de esquerda. Porquê? O que tu podes chamar de aburguesamento, é para muitos sinónimo de qualidade de vida. A visão romântica do amor e uma cabana é gira, e até serve muito bem a própria direita. Pobres mas orgulhosos, pois está bem.
P.S. Já é a segunda vez que digo 'ideário' hoje, estou tão contente comigo que me vou pagar uma mini.
Mini é coisa de esquerda, por isso podes.
Agora a sério. As minhas observações não são uma tentativa de impor seja o que for seja a quem for. Nem sequer me vejo como uma espécie qualquer de guardião da pureza dos ideais de esquerda. Sou demasiado incoerente para isso. Quando digo LCDs podes ler montes no alentejo ou carros desportivos para os filhotes de 18 anos. Tens todo o direito de querer coisas melhores. Mas tu nunca mandaste um caralho, nem eu. Nunca estivemos na posição de conduzir um país depois de uma revolução, como a geração que vive do nosso dinheiro e a outra que nos esmaga, que se apanhou a mandar e mandou a ideologia às urtigas.
PS - custa-me a admitir isto, mas passei a tarde no media market a escolher um cabrão dum lcd...
Deixa lá, há 2 anos que trabalho como um mouro e ainda não consegui comprar merda do LCD. Ao menos já tenho uma desculpa razoável para lá do consumismo puro: as fichas scart do meu chaço estão todas fodidas (iuhu!). Até já tenho autorização da minha mulher e tudo. Falta a autorização da minha conta bancária.
Quanto ao verdadeiro conteúdo da tua resposta, concordo, e a única forma de os tirarmos de lá será, talvez românticamente pensado (lá estou eu), por nós próprios jogarmos mãos à massa. Com o voto não vamos lá. A esquerda está irresponsável e a direita nunca viu para lá do gradeamento da quinta.
Talvez comece connosco a sermos mais empreendedores. Nas nossas próprias empresas ou nas juntas de freguesia, sei lá. Provavelmente estampamo-nos no caminho, mas pelo menos vamos tentar. Estou farto de ser do povo do fado e da saudade. Às armas, caralho! (metaforicamente falando)
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