sexta-feira, 11 de junho de 2010

O bilhar de bolso

Há coisas que definem um povo. E o nosso amor pela mini, pela sardinha e pela bifana, provavelmente as melhores coisas - juntamente com o Benfica - que este país tem, também nos define.
Nas últimas décadas, e sobretudo nos últimos anos, não têm faltado decisões e projectos que, de uma forma ou de outra, mudam estruturalmente a maneira da nossa sociedade funcionar. Cortam-nos direitos, mudam as regras, em geral vão-nos ao cu alegremente.
Bastam alguns exemplos:
- destruição dos serviços públicos
- encerramento de escolas e hospitais em todo o interior
- mutilação da nossa língua através do aborto ortográfico
- aumento generalizado de impostos
- corte de apoios sociais, incluindo dos mais necessitados
- aumento da idade da reforma
- corte dos feriado "porque sim"
- etc etc etc (para quem discorda pode colocar a liberalização do aborto ou o casamento gay)

Serve isto para dizer que não há muitos países que, como nós, tenham sido tão manipulados e penalizados pelas suas "elites". Quase tudo com dor, com desconforto, algumas coisas com mera resignação.

Há muitos motivos para ficarmos indignados (nem vale a pena falar nas injustiças que já existiam e que foram apenas agravadas). E se há uma coisa que me irrita é meia dúzia de badamecos medíocres, como quase toda a nossa classe política actual, tomarem decisões estruturantes para todos nós, e que ficarão para as gerações vindouras.

Um dos exemplos dados é o execrável aborto ortográfico, que vai mutilar e descaracterizar brutalmente a língua que tanto amo. No facebook, essa feira de vaidades e de "gosto/não gosto", nasceu um movimento, contra esta aberração e este verdadeiro crime lesa-pátria. Tinha, se não me engano, mais de 15 mil "amigos", ou lá o que raio isso se chama. E o movimento convocou uma manifestação, com o organizador, inebriado, a prometer que toda a gente ia ter "uma surpresa" com a adesão. E a surpresa, ou talvez não, é que estavam lá 3 tipos. O empenhado organizador e mais dois.
Nós somos assim, os tipos do "agarra-me se não eu fujo". Somos uns valentes do caraças dentro dos nossos pópós, mas fugimos quando cheira a porrada. Odiamos os políticos mas depois vamos atrás das campanhas e dos beijinhos dos Portas desta vida. Queixamo-nos desta merda e depois votamos sempre nos mesmos gajos. Somos tão caguinchas que fizemos uma revolução sem sangue, com flores. Deixámos os filhos da puta fugirem todos para o Brasil, acabando por voltar e mandar nesta merda toda outra vez. Somos tão borra-botas que somos uns racistas de merda mas não temos coragem de votar no PNR.
Em vez de andarmos felizes e a foder como deve ser, vamos em rebanho ao salão erótico e dedicamo-nos ao bilhar de bolso.
Somos o país do mundo com maior taxa de penetração do facebook. Adoramos o bitaite, adoramos proncunciar-nos sobre qualquer coisa, somos os maiores nos movimentos e na quadrilhice. Desde que no recato do lar ou nas horas roubadas ao trabalho. Somos os campeões mundiais da bazófia.
Não nos peçam é para ir para a rua.
Ar livre, só no Farmville.

5 comentários:

raviolli_ninja disse...

Muito sinceramente, de tudo o que tenho para me preocupar, o acordo ortográfico está no fundo da minha lista. Não merece sequer que me aborreça a carregar num botão de aderir à causa.

Compreendo que seja mais chato para quem dele não pode fugir, como os jornalistas ou os escritores. Eu vou simplesmente ignorá-lo, não por empenho e amor à pátria (blérgh!) mas puramente porque não estou para me aborrecer.

Já temos tão baixo índice de indignação que bem devíamos escolher melhor onde gastar as nossas munições.

Anónimo disse...

"Adoramos o bitaite, adoramos proncunciar-nos sobre qualquer coisa". Como prova este post.

Little Bastard disse...

Nem mais. A utilização da primeira pessoa do plural não é coincidência.

euexisto disse...

belo post!

Little Bastard disse...

ha, valente. um abraço para os Biscoitos. Belas tardes passei aí!