quinta-feira, 1 de julho de 2010

People just ain’t no good


Tradicionalmente, a esquerda é optimista e a direita pessimista em relação à natureza humana. O optimismo ingénuo de Marx não o levou a suspeitar que uma vez varrida a aristocracia económica numa sociedade comunista, o instinto de poder e de dominação característica da nossa espécie se revelaria sobre outras arrepiantes formas, se o poder político ficasse todo ele concentrado num único partido. Presto por isso a minha tardia homenagem ao Saramago, por ter sido um dos poucos comunistas lucidamente pessimista sobre a nossa condição. Todo o seu “Ensaio sobre a Cegueira” nada mais é do que um extenso manual sobre a irracionalidade, brutalidade e crueldade humana. Numa situação em que cegos partilham a mesma condição de privação e sofrimento, o que seria racional para todos melhorarem a sua condição seria cooperarem uns com os outros. Pelo contrário, o que realmente sucede (no livro e fora dele) é os cegos lutarem uns contra os outros numa luta impiedosa pela sobrevivência e pela dominação do mais forte. Claro que no livro aparecem também situações em que pelo contrário algumas personagens resistem à barbárie. Mas o que Saramago claramente assinala no seu livro é que gestos de compaixão e solidariedade são apenas breves intervalos na longa sequência de violência e dominação que tem sido a história humana. Que a esquerda aprenda de vez esta lição e nunca mais se lance em tenebrosas engenharias sociais que não tenham em conta o pressuposto de que o principal inimigo do homem sempre foi o próprio homem.

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