quinta-feira, 28 de outubro de 2010

A bola é quadrada

Se a política nacional fosse futebol, o último ano teria sido um jogo não muito bem jogado, mas muito interessante tacticamente.
Senão vejamos.
Passos Coelho é eleito, reforça o PSD. Sócrates ficou à rasca.
Depois é o congresso do PSD, que naturalmente deu a Passos Coelho um novo "elan". Sócrates fica pensativo, e um pouco mais apertado.
Repois rebenta a bronca das contas públicas. Sócrates fica apertado, Passos Coelho finge-se de responsável e assume os PEC I e II. Passos Coelho dispara nas sondagens, digamos que, nessa altura, estava "por cima no jogo".
Depois, inchado e demasiado confiante qual Jorge Jesus, dá uma de Carlos Queiroz e faz uma substituição suicida. A revisão constitucional foi o Paulo Torres de Passos Coelho.
Deu o flanco a Sócrates. Este percebeu que o flanco esquerdo do adversário estava desguarnecido, e canalizou por aí todos os seus ataques, através do extremo "I love Estado Social".
E eis que, de repente, Passos Coelho teve, finalmente, a sorte do jogo, na forma de um penalti infantil concedido pela equipa adversária.
Por outras palavras, a situação actual, com o rompimento das negociações para o OE, é a melhor coisa que lhe podia ter acontecido.
Este é o raciocínio:
Eu acho que Passos Coelho se vai abster e, assim, viabilizar este péssimo orçamento. Mas já conseguiu uma coisa, não se sujar muito e passar por responsável.
Depois do ultimato a Sócrates, para o qual este cagou de alto, Passos Coelho estava desesperado por uma única coisa: como ceder sem perder a face. E a intransigência do PS deu-lhe a escapatória perfeita.
Passos Coelho vai abster-se. Vai dizer: "vou ser responsável e evitar que venha para aí o FMI. Fui responsável porque quis negociar, fiz propostas concretas e o Governo foi irredutível e não quis negociar, não quis melhorar este mau orçamento. Mas este não é apenas um mau orçamento, é um orçamento da exclusiva responsabilidade do PS, e por ele deverá ser julgado".
É perfeito.
Não passa por irresponsável e pode fingir que tentou melhorar o documento, e que o PS não deixou. E mais, no dia a seguir à aprovação do orçamento, tem caminho livre para malhar forte e feio no PS, uma vez que não está vinculado ao orçamento, o que aconteceria se votasse a favor, após acordo com Sócrates.
É perfeito. De facto, neste caso, Passos Coelho teve mais sorte que juízo.
E é com este presente táctico que o PSD pode ganhar o jogo, embora pouco tenha feito para o merecer.
Sócrates, desesperado, de cabeça perdida e com jogadores a menos, meteu a mão à bola dentro da área.
Agora é só Passos Coelho converter o penalti.

Quem quer que ganhe, perde o país.
Mas, se isto não fosse gravíssimo, seria um jogo muito interessante.



                                                                                                        Deste Sócrates eu gosto.

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