sexta-feira, 11 de março de 2011

Warmup

Não nos equivoquemos.


Vamos ser ridicularizados, tal como tem acontecido até aqui.

Os bem-pensantes, os bem-falantes, os intelectuais do regime, tudo têm feito para apontar as deficiências programáticas do movimento que, este sábado, estará nas ruas em várias cidades deste deprimido país.

Os argumentos:

- Que querem privilégios iguais aos dos papás, o que não é verdade. Mas mesmo que fosse, por que razão não vejo esses comentadores atacar esses supostos privilégios? Ataca-se os novos que supostamente querem privilégios, mas nem uma palavra quando aos actuais beneficiários desses privilégios. E, repito, essa não é a questão.

- que são ridículos e, até, que não sabem escrever (como Sousa Tavares, esse grande escritor, fez questão de salientar). Como se para protestar, para reclamar direitos, houvesse uma norma, uma regra, uma única forma correcta de bem fazer. A malta que andava na reforma agrária, por exemplo, sabia escrever? E isso retirou-lhe algum tipo de legitimidade, quando o que falamos é de condições de vida?

- não defendem nada, são meros niilistas (esta última cortesia da pena afiada de Mário Soares). Como não é um movimento partidário (mesmo que alguns tentem dele apropriar-se), os instalados não sabem como lidar com isto. Como catalogar, como os meter nas gavetas da esquerda ou da direita, como os contabilizar nas contas de merceeiro de umas eleições deste sistema político moribundo. A geração de Mário Soares, por exemplo, fez o Maio de 68. E eram muito ridículos. Eram bastante niilistas. Exigiam, entre outras coisas, o declaradamente “impossível”. No ridículo movimento hippie, era a mesma história. Mas, quando implodiu, deu origem a reformas sociais fundamentais, que hoje damos por garantidas: a ecologia e a emancipação feminina, por exemplo.

- que são poucos, que só se mexem para clicar no rato. É verdade, é sinal dos tempos. A ver vamos.

- que atacam as gerações anteriores mas que essas sofreram muito mais. Pois, mas a verdade é que isso sempre foi assim. Os dos anos 60 e 70 são os únicos que, aparentemente, têm legitimidade para definir o que é ou não uma boa manifestação, quais as que passam no teste do algodão da pureza intelectual. Mas esses, quando se manifestavam, tinham também uma vida melhor do que os seus antecessores. E isso não os impediu de gritar que não se podia confiar “em ninguém com mais de 30 anos”. Era ridículo? Sim. E então? A questão é que, ridículo ou não, a história, pequena ou grande, transformou-se com protestos, com movimentos, com as pessoas a chegarem-se à frente e a dizerem o que pensam. Portanto, se valer esse argumento de que os de agora vivem melhor do que os anteriores, nunca qualquer protesto fez sentido. Incluindo os protestos destes senhores que, agora, se enojam com quem vai manifestar-se. A diferença é que, pela primeira vez em muito tempo, há sérias hipóteses de esta geração, e as próximas, viverem pior do que as anteriores. Isto é inédito, e merece reflexão.

Amanhã, e nos jornais dos próximos dias, e nos blogues e nas televisões, não faltarão tentativas de ridicularizar o protesto. Que os manifestantes têm ténis de marca; que vão beber umas jolas, que vão dizer patacoadas para os directos das rádios, que eram poucos, que eram muitos mas silenciosos, que foram instrumentalizados, que foram violentos, que foram demasiado mansos, que isto, que aquilo.

Vai valer tudo, e não podemos ganhar.

A verdade é que, com o debate que finalmente se conseguiu instalar, nós já ganhámos.

E é com esse espírito que devemos comparecer amanhã. Às 15h, no Marquês.

3 comentários:

Carlos Carvalho disse...

Três grandes posts Little Bastard.

Respeito para a tua consciência social conhecendo as armadilhas a que isso pode levar.
Espero que o Jerónimo não se cole à manifestação, pois leva o mesmo tratamento como se fosse o Paulinho Portas.
Esperemos principalmente que a malta se saiba comportar.

Carlos Carvalho disse...

A parte dos niilistas fez-me lembrar o "The Big Lebowski" dos irmãos Coen:

Donny: Are these the Nazis, Walter?
Walter Sobchak: No, Donny, these men are nihilists, there's nothing to be afraid of.

Carlos Carvalho disse...

Foi bonita a festa pá!

http://www.youtube.com/watch?v=PsJpeR2K-is