segunda-feira, 23 de maio de 2011

A Campanha

Finalmente começou, de forma oficial. E começou quando a gente já não os pode ouvir. O início da campanha não significa nada. É como a abertura da época balnear, quando a gente já se fartou de ir à praia. É uma coisa puramente mediática, sonho molhado de jornalista, e mais nada. Sobretudo num país em que todo o Governo está, há um mês, na estrada. A inaugurar toda e qualquer irrelevância, deixando um país intervencionado pelo exterior sem Governo, de facto. A circunstância de nós, contribuintes, continuarmos a pagar o ordenado de todos os ministros, secretários de Estado, assessores, etc, e eles não estarem a fazer aquilo para que são pagos...enfim, está tudo dito.
Os dados-chave da campanha estão há muito lançados.
O PSD deverá ganhar, com uma margem reduzida de até 5%, mas que provavelmente será bem menor. Passos Coelho cometeu um erro básico: esqueceu a lição de todas as eleições em Portugal, de que ganha quem não fala nem apresenta propostas.
Propostas não lhe faltam. As dele, as do Catroga, as dos medíocres dos "compromissos Portugal", as do tipo que serve cafés na sede do PSD. Centrou a sua campanha nas propostas do que entende ser a "modernização" de Portugal. Discordo da esmagadora maioria delas, mas percebo-as. E errou ao recusar fazer o básico: julgar e condenar Sócrates. Na prática, a sua campanha devia ser só assim: "este senhor está lá há seis anos e estamos pior em tudo; levou-nos à bancarrota e teve de pedir ajuda internacional, pela primeira vez em 20 anos". Ponto final.
Mas não. Anda com a tusa do mijo e quer fazer coisas, o menino. Ideologicamente estou nos antípodas do que Passos defende, mas acho absolutamente legítimo que o faça, e com a máxima clareza possível.
O grande, enorme erro de Passos foi não ter feito uma coligação pré-eleitoral com o CDS. Toda a gente sabe que se vão juntar, não entendo por que raio não o fizeram antes. É que isso significaria - até em termos de sondagens - focar toda a campanha na questão de a coligação vir a ter, ou não, maioria absoluta. Essa seria a única questão, que abafaria tudo o resto e, em termos práticos, arrasaria animicamente a campanha do PS. Sem essa coligação, a questão da campanha é, ainda, quem vai ganhar: PS ou PSD. E isso dá a Sócrates e à sua máquina um suplemento de alma que, francamente, ele não merecia ter.
Sócrates segue à risca a linha maquiavélica que traçou desde a encenação do PEC IV. O guião está escrito desde então, e não há o mínimo desvio.
Só estamos como estamos por causa do PSD, que mandou o Governo abaixo. Esquece-se que não foi só o PSD mas toda a gente. Incluindo o CDS, a quem ele quer agora coligar-se, mas a quem ele parece perdoar aquilo que atira ao PSD como um crime de lesa-pátria.
O PSD (e pelos vistos só o PSD) atirou o Governo abaixo num momento de fragilidade do país, apenas por sede de poder. Esquece-se que não houve qualquer moção de censura: o Governo caiu porque SE DEMITIU, porque ele quis fazer o bluff do tudo ou nada com o PEC IV, com o objectivo que se conhece, a vitimização. Se houve irresponsabilidade foi de quem se demitiu na primeira ocasião em que, democraticamente, o parlamento se recusou a apoiá-lo, e com toda a razão. A democracia é lixada, e Sócrates não nasceu para governar sem maioria absoluta. Quando confrontado com a sua maioria apenas relativa, não aguentou e bateu com a porta. Mas a culpa, claro está, é dos outros.
O PS é Portugal. Aliás, Sócrates é Portugal. Uma espécie de Rei Sol, o pai do povo, um Salazar amigo em versão para consumo doméstico. O lema da campanha do PS, escolhido a dedo por um marketeiro pago a peso de ouro é "Defender Portugal". Presume-se que todos os outros queiram "Atacar Portugal", uma vez que se atrevem a atacar Sócrates.
Passos Coelho não tem experiência, e é perigoso "entrarmos em aventuras" com alguém sem experiência, numa altura destas. Eu diria que quem tem experiência são os portugueses. Têm seis anos de experiência xuxalista às costas, ficando mais pobres e vendo enriquecer os Armandos Varas e os Ruis Pedros Soares desta vida.
Todo o discurso de Sócrates é centrado no ataque ao PSD. Sócrates não fala do seu programa, porque na verdade não o tem. É uma compliação de banalidades de um Executivo esgotado e descredibilizado, que se agarra ao tacho e se debate mais por instinto do que por convicção, como uma galinha já sem cabeça. Mais: ataca as medidas liberalizantes do PSD, muitas das quais estão no acordo que Sócrates assinou com a troika. Defende o Estado Social, ele que foi quem mais fez para o desmantelar. Ouve-se Sócrates, e fica-se com a sensação de que está tudo bem; que não é preciso fazer nada; que é preciso é aquele seu insuportável optimismo desmentido pela realidade a cada momento; que o PS não percebeu que é preciso mudar de vida; que, na verdade, se o PS ganhar, aquela coisa da troika não interessa para nada, apesar de ser a assinatura deles que lá está.

Sócrates joga o tudo ou nada num exercício de demagogia e negação. Chegou ao ponto de arregimentar uma data de emigrantes (paquistaneses, sobretudo), que nem sequer podem votar em Portugal, para andarem na sua caravana de campanha, para ajudar a fazer número, em troca de almoço. Deixou-nos na penúria para alimentar os seus amigalhaços da máquina xuxalista. Deixou-nos na bancarrota, de mão estendida, e à mercê de todas as políticas liberalizantes que o FMI queira, e quer, implementar. Foi Sócrates quem nos atirou para as mãos da Direita. E, depois de tudo isto, ele consegue ter a cara de pau para, nem que fosse por uma única vez, nunca admitir que errou. Eu já não digo pedir desculpa, que seria o mínimo. Mas admitir que errou. Não. Faz parte da personagem Sócrates, da ficção Sócrates, nunca admitir o erro. No dia em que o fizer, a máscara cai.
A tudo responde com ataques aos outros, como se ele não tivesse nada a ver com isto. Sempre na óptica de "os outros são piores que eu, que por acaso sou espectacular e a única esperança deste país".
Tenho vergonha deste país, por um tipo como este merdas estar com possibilidades de nos voltar a governar. Mas, mais uma vez, se isso acontecer, teremos o que merecemos. 

Tal como aconteceu com os alemães em relação a Hitler, haverá um dia em que nós, enquanto sociedade, conseguiremos olhar para trás e perguntar-nos: "como foi possível cairmos, mais do que uma vez, nas patranhas deste tipo?"

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