terça-feira, 17 de novembro de 2009

Os filhos de Dylan


Quem acha que Bob Dylan não é mau mas que o seu contributo para a história da Pop é sobrevalorizado está enganado por duas razões.
Primeiro, porque Dylan foi o primeiro ícone pop da liberdade artística: depois de Dylan ter conquistado o sucesso e o reconhecimento num registo folk e político, não quis ficar prisioneiro da sua identidade, aventurando-se num novo registo eléctrico e despolitizado. Ficou célebre o concerto em que depois de uma previsível primeira parte folk só com viola e harmónica, Dylan surpreende os seus fãs esquerdistas sentem-se traídos com o som "burguês" e estridente de guitarras eléctricas distorcidas, começando a gritar "Judas" e a abandonar o concerto. Dylan sempre foi assim, avesso às modas, aos rótulos e aos fechamentos ideológicos, coerente apenas com a sua liberdade, tocando folk no hype do rock, rock no hype do folk, country no hype do rock psicadélico, esquerdista quando a esquerda era uma pequena minoria, apolítico quando a contracultura esquerdista começou a entrar na moda.
Segundo, porque Dylan foi o primeiro a trazer a literatura para a Pop, aliando a simplicidade Pop com a inteligência e sofisticação das suas letras. A influência desta atitude sobre a pop subsequente é incalculável. Em 1964, dá-se o encontro mais importante de sempre na história da Pop: Dylan encontra-se com os Beatles, põe-nos pela primeira vez a fumar charutos, convence-os a escreverem letras mais elaboradas e canções mais experimentais. A partir deste encontro, os beatles deixam de repetir a fórmula do "she loves you, ye, ye, ye", e inauguram a sua fase mais criativa e psicadélica, ainda incipiente no "Rubber Soul", mas já plenamente conseguida no genial "Revolver" e em todas as obras primas que se lhe seguiram. Depois, claro, a influência dos beatles sobre toda a pop que se lhe seguiu é avassaladora, desde o Bowie nos anos 70, aos Smiths nos anos 80, aos Blur nos anos 90, aos Strokes nos anos 2000, que dia é hoje? E cada vez que surga uma nova banda de putos de vinte anos com uma pop simples, elegante e inteligente, podem até nem sequer conhecer o "Highway 61 Revisited" ou o "Blonde on Blonde", mas são, sem o saberem, mais uns grandecíssimos filhos de Dylan.

2 comentários:

Little Bastard disse...

Não nego a relevância, mas é um secas do caralho. E, com tanta reinvenção, anda a fazer o mesmo disco (enfim, os mesmos três discos) desde o início.
Voto no Neil Young (no mesmo registo algo monótono) e, sobretudo, no Tom Waits.

raviolli_ninja disse...

Se alguém fala aqui do Devendra Banhart, amasso-lhe os dentes.