quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Dúvidas e perplexidades sobre o 25 de Novembro - Parte II

Vou retomar aqui o tema que o Papousse no outro dia aflorou: o 25 de Novembro. Sou muito ambivalente em relação a esse processo. Por um lado, vejo-o como algo muito negativo: vitória das forças mais conservadoras sobre as forças mais progressistas; o fim da espontaneidade naif mas sincera das milhares de pessoas que acreditavam genuinamente que era possível criar um Portugal justo e fraterno sem classes sociais; o sonho e a utopia a cederem lugar à "normalização democrática", com tudo o que isso implica de conformismo, resignação, real politik, tacticismo, corrupção, hipocrisia, demagogia, populismo e cedência aos interesses dos mais poderosos (nomeadamente o interesse do capital económico e financeiro português e internacional). Por outro lado, vejo o 25 de Novembro como um processo com alguns elementos positivos, já que o outro lado da barricada (PCP e extrema esquerda, nomeadamente a UDP e a LCI/PSR que mais tarde deram origem ao BE) não era propriamente constituído por um grupo de anjinhos. O PCP sempre foi uma extensão política do PCUS, que recebia apoio da União Soviética e que, ao que tudo indica (se bem que ainda é muito cedo para se fazer uma história rigorosa de acontecimentos ainda tão recentes) só não avançou com uma guerra civil e uma revolução do tipo "soviético" porque a União Soviética lhe retirou o tapete: na altura havia uma espécie de Tratado de Tordesilhas entre os Americanos e os Soviéticos, em que ambos acordavam não interferir na esfera de influência do outro, e Portugal, pertencendo à Europa Ocidental, estava claramente no eixo americano. A extrema-esquerda também não era uma alternativa propriamente muito democrática: muitos apoiavam o modelo chinês e albanês; e todos (ou quse todos) representavam o excesso revolucionário não pensante, em que se ocupava, saneava, lavantavam-se barricadas, sequestrava-se, despedia-se tudo o que eles considerassem inimigos da classe operária, em operações colectivas completamente ilegais e anti-democráticas. Não nos podemos esquecer que em nas primeiras eleições democráticas em 25 de Abril de 1975 (eleições para a Constituinte) venceu o PS por 38%, o PCP teve só 12% e a extrema-esquerda teve uma votação meramente residual. Nesse sentido, quando o Grupo dos Nove liderado por Melo Antunes (facção menos esquerdista do MFA e do Conselho de Revolução), comandou as operações do 25 de Novembro de forma a que os militares entregassem o poder aos partidos democraticamente eleitos, só posso ter simpatia por essa causa. Que o povo português repetidamente tenha decidido eleger repetidamente as forças políticas mais conservadoras, de tal forma a que Portugal, ainda hoje, assume a vergonhosa posição de ser o país mais desigual da União Europeia, é algo que é só culpa do povo português (apesar de termos de democraticamente aceitar o veredicto do povo) e não do 25 de Novembro e seus apoiantes.

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