quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

A carroça e a política

Vou desperdiçar esta posta inteirinha a tentar demonstrar a inútil e estupefacta tese de que o PCP e o BE são, para o bem e para o mal, os ciganos do nosso sistema político-partidário.

1. Assim como os ciganos têm sido mantidos à margem da sociedade portuguesa desde que para cá emigraram no século XV, também a esquerda à esquerda do PS tem sido mantida fora do nosso sistema político desde o fim do PREC em 1976.

2. Assim como os ciganos responderam a essa hetero-exclusão secular através da sua própria auto-exclusão (fechando-se sobre si próprios para melhor se defenderem das ameaças externas à sua própria sobrevivência) também a esquerda à esquerda do PS optou por se defender da sua ostracização, auto-excluindo-se do sistema (recusando quaisquer coligações governamentais e votando sempre contra o orçamento do estado, abdicando assim de exercer qualquer influência sobre o mesmo).

3. A auto-exclusão do PCP e do BE(tal como a dos ciganos) é uma faca de dois gumes: se por um lado os protege o suficiente para permitir a sua sobrevivência, através de uma identidade forte definida em clara diferenciação e demarcação do PS para evitar a sua diluição no mesmo (como já sucedeu com os partidos congéneres de outros países europeus como a França e a Itália), por outro lado, o preço a pagar por essa cultura de contra-poder, é o seu escasso poder de influência na definição das principais políticas públicas, entregando de bandeja à direita este poder de influência, o que gera um crónico enviesamento do nosso sistema político à direita.

4. Tal como os ciganos, também comunistas e trotskistas são indivíduos extremamente perigosos.

Já acabou. Eu bem vos tinha tinha avisado da inutilidade desta posta.

19 comentários:

professor x disse...

Por acaso pensava que era por ninguém votar neles, injustiças da democracía.

Funafunanga disse...

Mas não só...

1. À semelhança dos ciganos, têm o mesmo patriarca durante décadas, sem que ninguém ouse pô-lo em causa.

2. À semelhança dos ciganos, se um deles ocupa o lugar tradicionalmente reservado ao outro na feira de Alhos Vedros, temos molho - ora vejam: http://autoridadenacional.blogspot.com/2009/12/se-o-be-podia-viver-sem-copiar.html

3. À semelhança dos ciganos (alerta: a frase seguinte pode revelar-se chocante para mentes mais politicamente correctas), querem trabalhar o menos possível, pedem sempre mais do que o razoável (táctica "Quem não chora não mama") e que o Estado resolva os problemas.

4. À semelhança dos ciganos, se uma moça se enrola com um dos "outros", tem ódio para o resto da vida.

5. Por fim, à semelhança dos ciganos... festa do Avante, acampamentos do bloco... need I say more?

o homem do estupefacto amarelo disse...

Caro Funafunanga,

Para alguém que como tu é oriundo da mesma direita liberal que provocou a maior crise financeira e económica desde 1929 (com os efeitos devastadores que se conhecem a nível do desemprego e da saúde das contas públicas), julgo ser um pouco inoportuno criticares a intervenção do Estado na economia (ver ponto 3). No entanto, já percebi que se está a tornar um padrão: os fundamentalistas do mercado têm uma memória extremamente curta e já não têm vergonha nenhuma de mostrar outra vez as suas garras.

Funafunanga disse...

Homem do estupefacto amarelo,

Alegra-me não me teres chamado fascista. Tu és mais sofisticado do que isso, o que é bom. A sério.

Contudo, enganas-te se me supões oriundo da 'direita liberal'. Não tenho qualquer pudor em dizer que, em muitos casos, os particulares, entregues a si próprios, entram no modo 'lei da selva'. Tem de haver intervenção do Estado. Considero é que ela deve ser subsidiária face à dos privados e não creio numa economia fortemente estatizada como defendem os partidos de esquerda. A intervenção do Estado, entendamo-nos, não é um fim em si mesmo, mas um meio para resolver problemas que os privados sozinhos não resolvem - e apenas na medida em que os resolve melhor. Mas muito mais avesso sou a essa mentalidade, que tem causado sérios entraves ao desenvolvimento deste país, de esperar que o Estado faça tudo pelas pessoas, que leva ao imobilismo, à lamúria e à subsídiodependência - foi isso que critiquei.

Crises como esta previnem-se pela regulação eficaz e pela responsabilização dos agentes económicos, não pela nacionalização de sectores inteiros da economia (que, uma vez nacionalizados, deixam de dar lucros como outrora e geram encargos). E por uma cultura de produção e poupança, não de especulação e de crédito.

Orelhas Quentes disse...

Epá!

Eu só ia comentar a dizer que estava de acordo com o post.

Mas agora tenho que comentar a dizer que estou de acordo é com o Funafunanga!

Arranjam-me cada inbróglio!

Ada disse...

Mais uma: tal como os ciganos, a esquerda é totalmente desprovida de sentido de humor. Ofendem-se facilmente. Experimentem contar uma piada de paneleiros a um bloquista.

Havia um opúsculo do George Orwell muito verdadeiro no ponto de partida, chamado "Why socialists don't believe in fun".

o homem do estupefacto amarelo disse...

Melhor ainda: experimentem contar uma piada de padres paneleiros pedófilos a um democrata cristão.

o homem do estupefacto amarelo disse...

Caro Funafunanga,

Agrada-me saber que afinal não és adepto do liberalismo económico selvagem e que reconheces a importância fulcral que o Estado deve desempenhar na regulação dos mercados. Pena tenho é da caricatura política que fazes da esquerda à esquerda do PS. O BE e até o próprio PCP defendem nos respectivos programas políticos a existência de uma economia mista. O BE (partido em que sempre votei) defende no seu programa apenas a desprivatização do sector da energia (Galp e EDP), uma vez que não há nenhuma racionalidade económica em se nacionalizar um monopólio natural, transformando um monopólio público num monopólio privado e que um poder tão grande dado a apenas uma empresa privada (como a Galp) favorece a captura das entidades reguladoras, como facilmente se percebe que sucedeu com a nossa Auroridade para a Concorrência.

Além do mais, relembro-te que num país em que quase metade dos desempregados não têm direito a subsídio de desemprego o problema de Portugal não é certamente o peso excessivo do seu Estado Social.

professor x disse...

Quando a tendência é a bipolarização, dois partidos à esquerda do PS é um luxo. A margem é pequena demais para dois, um único Bloco na esquerda com um discurso mais moderado (tal como é o do Portas à direita) mudaría tudo, mas a esquerda é mesmo assim, as raízes ideológicas falam sempre mais alto.

Gajo Que Teima Em Escolher Lados disse...

Cheira-me que o Funfunanga não é do BE, logo, estou do lado dele.

Little Bastard disse...

Fascista!!!

Não deixas de ter alguma razão...

Fascista!!!

Little Bastard disse...

Ada..

Ada é nome de gaja, não é?

Há uma gaja no Vodka?!

Donde teklas?

o homem do estupefacto amarelo disse...

Caro Professor X,

Não considero que a franja do espectro político à esquerda do PS seja pequena de mais para albergar dois partidos. A prova é que o crescimento do BE nunca foi feito à custa do decrescimento do PCP. E ainda bem. Faz todo o sentido continuarem a existir estes dois partidos porque ocupam espaços ideológicos distintos: uma esquerda mais libertária da parte do BE e uma esquerda mais conservadora da parte do PCP. Como eu já disse em postas anteriores, um problema realmente existente no nosso sistema partidário está no facto de não existir nenhum partido que ocupe o espaço da direita libertária. No outro dia, o provável próximo líder do PSD, Passos Coelho, ultra-liberal do ponto de vista económico, afirmou abertamente que é contra o casamento dos homossexuais.

funafunanga disse...

Caro o homem etc.,

"a desprivatização do sector da energia (Galp e EDP), uma vez que não há nenhuma racionalidade económica em se nacionalizar um monopólio natural, transformando um monopólio público num monopólio privado e que um poder tão grande dado a apenas uma empresa privada (como a Galp)"

Mas a galp nunca foi monopólio natural no sector da refinação e distribuição de combustíveis. Quanto à EDP, após a separação entre EDP e REN está para breve a concorrência na distribuição de energia.

Quanto à captura dos reguladores, bom, eu diria antes a captura do Estado como um todo por alguns grandes grupos - e, conexamente, a captura de empresas pelo Estado (por falar nisso, mera curiosidade: já repararam como a Mota Engil fica em altas em governos PS e como a Somague ou Teixeira Duarte deixam de ver-se, e como as coisas viram ao contrário quando o governo é PSD?). Sabemos que a república se vende aos grandes interesses. Vemos acontecer em todo o mundo. Mas é o preço a pagar por viver em democracia (toda a política tende para a oligarquia e toda a economia tende para o oligopólio - mesmo em países colectivistas, com as suas nuances - é a natureza humana, bem vês). O objectivo é, no meio disto, salvaguardar e beneficiar o interesse de todos. Vendem o interesse público? Pois que o vendam caro.

o homem do estupefacto amarelo disse...

Caro Funafunanga,

1. Enganas-te: a Galp tem o monopólio da refinação, o que naturalmente depois gera um oligopólio na distribuição.

2. Explica-me a vantagem pública de 49% da REN ter sido privatizada, quando o conjunto gigante de cabos e postes eléctricos que ela gere é o paradigma clássico de um monopólio natural onde nunca haverá concorrência, pela colossal economia de escala que ela implica. O que o Estado fez foi simplesmente entregar de mão beijada uma renda vitalícia a capitalistas ociosos que têm aversão ao risco e que só sabem ganhar dinheiro parasitando o estado.

3. Sou a favor da concorrência na distribuição da energia, mas mantendo um sector público forte neste bem estratégico, como sucede com excelentes resultados na Noruega- país insuspeito pelo vigor da sua economia de mercado.

o homem do estupefacto amarelo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
funafunanga disse...

A racionalidade económica das privatizações? Nos últimos anos, todos sabemos qual tem sido: cobrir o défice com receitas extraordinárias. A grande panaceia de última hora de apertos orçamentais de sucessivos governos. Medidas em alguns casos acertadas, implementadas pelos motivos errados. Quanto à REN, o objectivo é a detenção do capital maioritariamente por privados – 534 milhões de acções, sendo 261 660 000 acções da categoria A (para titularidade pública), e 272 340 000 acções da categoria B (a privatizar) - o que, à falta de um acordo parassocial entre a maioria privada, permitirá ao Estado continuar a ter basicamente o controlo da situação. A racionalidade económica da privatização encontro-a no facto de o Estado ser, em geral, um fraco empresário, e de o dinheiro ser, por regra, mal gerido, quando não é nosso e quando não se conhece o ‘patrão’. A TAP e a CP são um exemplo (embora estas sejam dificilmente privatizáveis, pelo menos com o tipo de problemas estruturais que têm – por não haver quem as queira). O Estado, ao privatizar, muitas vezes livra-se de encargos avultados, beneficia da gestão privada, para receber depois receitas fiscais decorrentes da boa gestão. O sistema das golden shares parece aliar o melhor de dois mundos, embora seja menos transparente e de os tipos da comissão europeia não irem muito à bola com isso.

Há funções do Estado que não devem ser privatizadas, justamente pelo seu valor estratégico. As chamadas funções de soberania, funções essenciais de natureza assistencial e prestações públicas, sem dúvida. A exploração de bens do domínio público, tendencialmente. Um pé na banca: penso na CGD, imprescindível. Outras pessoas terão outra perspectiva do que constituem empresas estratégicas não privatizáveis. Isso tem que ver com a noção de ’estratégico’. Para mim, serão aquelas que permitem ao Estado ter uma ‘tábua de salvação’ em situações de crise aguda macroeconómica que a regulação, só por si, não resolve (e há que pesar os custos associados a manter esses recursos produtivos na esfera do Estado – de modo a que sejam parte da solução, e não do problema). Para quem a ‘estratégia’ envolva uma intervenção directa do Estado a título sistemático, quotidiano, na economia, naturalmente que as empresa estratégicas serão mais.

E tens razão – a Galp tem um monopólio (não sei se será natural, pelo menos de facto) na refinação. Falou-se em tempos, antes da crise, suponho, de abrir uma refinaria em Badajoz, o que seria uma perspectiva interessante.

Tipo Que Se Entusiasma Fácilmente disse...

Funafunanga a PM!!

o homem do estupefacto amarelo disse...

Caro funafunanga,

1) Chamo-te a atenção para o facto do Estado Português privatizar precisamente as empresas públicas mais eficientes e geradoras de enormes receitas para o Estado, comprometendo assim, a médio prazo, a saúde das contas públicas, e, ainda para mais, vendendo as acções a um preço muito inferior ao que pouco tempo depois elas valem no mercado.