terça-feira, 13 de outubro de 2009

Um voto em branco não passa disso mesmo, um voto em branco

Numa manobra de diversão para distrair a atenção dos leitores em relação à retumbante derrota do BE (que não pode ser explicada unicamente pela difícil penetração de um partido recente no difícil jogo das autárquicas, mas que também radica, em parte, na sua cultura sectária de anti-poder), quero-vos falar de um dos vencedores da noite: os 41% de eleitores que se abstiveram. Devo dizer que não tenho qualquer simpatia pela causa que abraçaram. A mensagem que os abstencionistas implitamente estão a transmitir com a sua decisão em não votar (sim, também é uma escolha) é que não acreditam na democracia, e que devem ser os outros a decidirem por elas. Ora, continuo a acreditar que a democracia é o pior sistema com excepção de todos os outros, pelo que não me quero excluir do processo de tomada de decisão em relação à questão política, por excelência: em que direcção é que queremos levar o nosso estrambólico e macambúzio rectângulo?

Devo também dizer que tenho muito mais simpatia pelo voto em branco. O seu subtexto é até bastante simpático: "revejo-me na democracia, por isso faço questão de ir votar em vez de ir coçar a micosa para o Algarve, mas acho que todos os partidos políticos existentes são demagogos e populistas, colocando o seu interesse corporativo acima do interesse público." Ora, há um grande fundo de verdade nesta mensagem: apesar de muitas excepções honrosas em todos os quadrantes políticos, um partido é, por definição, uma máquina que precisa de ceder sempre à demagogia para sobreviver no feroz circo político (onde vale tudo menos fazer corninhos no parlamento). Contudo, acho que os problemas inerentes do voto em branco superam em muito essa sua virtualidade. E quais são esses problemas?

Em primeiro lugar, o voto em branco é extremamente pobre em termos de transmissão de informação. Além de ser um statement para pressionar os partidos para a diminuição da sua demagogia, o voto em branco não dá mais sinal em nenhum em relação ao rumo que Portugal deve seguir. Ao contrário do que sucede com os outros votos, não se sabe se um voto em branco é de esquerda ou de direita, se é liberal ou conservador, se é favor de mais estado ou menos estado, se em casos de haver um dilema entre eficiência e equidade, devemos optar pela eficiência ou pela equidade, etc., etc.. Ou seja, um voto em branco é um enorme desperdício: a riqueza de ideias que potencialmente um votante em branco tem sobre o país não cabe no seu voto, transbordando quase tudo para fora dele.

Em segundo lugar, e estando estreitamente relacionado com o argumento anterior, o voto em branco é muito inconsequente: não só não ajuda nada em relação à escolha de um rumo para o país, como mesmo o propósito de pressionar os partidos para se tornarem menos populistas é, julgo eu, totalmente ineficaz. Mesmo que se atinja um dia a utopia de 70% de votos em branco, julgo que os partidos não mudarão porque a natureza intrínseca do jogo político não permite essa mudança.

Dito isto, continuo a achar (apesar de não poder ser um bom juiz em casa própria) que o melhor voto é um voto no partido que cada um considere o mal menor, depois de ponderar as vantagens e desvantagens de cada um deles. Eu sei que não é uma visão muito romântica da política (e não era essa a visão que eu tinha há dez anos atrás) mas, parafraseando a grande política dos nossos tempos, Manuela Ferreira Leite, "é a vida". Um voto em branco não passa disso mesmo, de um voto em branco.

2 comentários:

Little Bastard disse...

Concordo em quase tudo, mas acho que se os votos em branco chegassem aos 70 ou meso aos 50%, muita coisa tremeria neste país. Mas mesmo assim nada mudaria. Todos os partidos - mesmo os mais institucionais e com mais responsabilidade - tentariam capitalizar esse protesto e esse descontentamento, que eles interpretariam como dirigidos aos outros partidos. De qualquer forma, respeito o voto em branco. E mais, acho que muita gente vai para a cabine de voto sem certeza sobre em quem vai votar. E, nesse caso, se calhar um voto em branco até seria o mais ajuizado.

matrafisco disse...

se os votos em branco chegassem aos 50%(ou mais que o partido mais votado) as eleições teriam que ser anuladas. é impossível algum partido capitalizar um voto em branco, quando foram a eleições, e foram postos de lado.

há demasiada gente a mamar dos partidos e de eles estarem no poder para alguma vez o voto em branco ser levado a sério como protesto.